27/04/15

O êxodo do século XXI - responsabilidade do mundo



Fico a imaginar-me numa vida em que:
o medo seja companheiro diário;
em que sair à rua seja caminhar numa linha de fogo;
em que a minha casa possa transformar-se na sepultura de meus filhos.
Lutar pela sobrevivência é um instinto natural de qualquer ser vivo. Lutamos até ao limite de nossas forças.
Possivelmente, a viver as mesmas condições de vida, eu seria uma das que empreendem a travessia árdua em busca de uma sobrevivência menos brutal, mesmo que consciente de que a Europa não é um paraíso, mesmo a saber que não seria bem-vinda.

Porque:


«É melhor morrer só uma vez»

– afirmação de uma jovem síria que viu na Bolsa de Estudos o passaporte para fugir da destruição da guerra. A entrevista em que relata como é viver numa guerra que já matou mais de 215 mil pessoas pode ser lida AQUI.

Há uns anos atrás, essa travessia era tentada, principalmente, por terra.
Foram tomadas medidas no intuito de travar a entrada dos migrantes: fechar acessos.
  • a Espanha construiu em 1998 os muros que separam as cidades de Ceuta e Melilla de Marrocos, que são incrementados com arame farpado, câmaras de vigilância e sensores.
  • a Grécia, considerada a porta dos fundos de entrada de refugiados e migrantes que chegavam através da Turquia, além de reforço no policiamento das fronteiras e medidas de represálias contra estrangeiros ilegais, construiu, em 2012, um muro ao longo do rio Evros que faz a fronteira com a Turquia para desencorajar a travessia.
  • a Bulgária, outro país fronteiriço com a Turquia e que passou a ser mais procurado como porta de entrada depois da construção do muro grego, em 2013 ergueu uma cerca de arame farpado na fronteira com o país turco.

Mas nada desmotiva essas pessoas, porque

26/04/15

Era um domingo calmo...



Era um domingo calmo, não que tivesse sossego. Aquela era a calma da inércia, que nunca tem pressa para coisa nenhuma. A calma do domingo era da que se veste de mansidão na ânsia de ludibriar os que procuram tranquilidade.
Era um domingo que amanhecera molhado e que agora deixava que o sol morno o enxugasse, embora indeciso entre o sol e a chuva… cheio de reticências e vazio de vontades.

Era um domingo que contagiava a todos com sua lassidão e acreditava que era porque gostavam dele, sem perceber que estavam ansiosos para que se fosse embora, o domingo…



25/04/15

Democracia!



Portugal chama à lembrança, mais uma vez, a data em que seu povo conquistou a liberdade.
Liberdade essa que proporcionou a esse povo uma nova forma de estar na vida e na sociedade.

Passou a ter direitos, embora ainda hoje, volvidos 41 anos, muitos ainda não entendam o verdadeiro significado desse termo.
Passou a ter direito a defender os seus direitos, embora esse direito não lhe assegure o êxito de suas pretensões e, até possa ser passagem directa para o nada.
Passou a ter direito a escolher quem o represente e governe, apesar de essa escolha ser restringida por uma oferta, nem sempre da qualidade pretendida ou, por outro lado, vir a mostrar-se bem aquém do esperado.

Passou com isto, a ouvir e a aprender a proclamar que vive numa Democracia. Tem estado convencido de que vive, de facto, numa Democracia, porque pratica o direito ao voto.

E depois do voto?
É o adeus à definição original de Democracia, que deixa de ser um
“Governo do povo, para o povo e pelo povo”.

O voto, esse direito fundamental, tem dado direito ao povo a eleger uma “carga de trabalhos”.

Porque, ao longo deste período da proclamada Democracia, temos tido nos postos que deveriam servir para defender os interesses dum povo, uns quantos que entendem por “povo” como sendo a dúzia e meia de companheiros de interesses de meia-lua - que só reflectem luz para si próprios, deixando a restante parcela do povo na face do lado de lá, na escuridão.

Um povo que não tem direito ao trabalho não pode ser, jamais! livre.

Não queiramos passar mais quarenta anos apenas a gritar o slogan "Viva a Liberdade", a fazer de conta que somos livres. 


Factos:
Portugal é um dos quatro países

18/04/15

Uma forma de amar


Peguei em mim,
Doei-me a ti inteira,
Rasguei-me em pedaços,
Aconcheguei-te as dores
Que acolhi no regaço.
Tirei lascas
De mim própria
Para compor teus remendos.
Neguei minhas dores
Para manter-me sóbria
E lutar contra dragões.
No caos de mim mesma,
Resgatei-te do abismo
E, ao erguer-te aos céus,
Tremeu-me a terra aos pés,
Em violento sismo.
Padeci.
Fui errante.
Quis morrer.
Morri
Por ter feito da tua,
A minha vida.
Por ter, em teu respirar,
O meu fôlego.
Por teus sonhos
Terem sido meus desejos
E querer que tuas vitórias
Sorrissem em mim
Com os quentes sabores
Da conquista.


14/04/15

Manhãs de abril


As manhãs de abril acordam a sorrir.
Beijam a luz e pedem ao sol
que lhes tire o casaco
com que cobrem os ombros.
São manhãs frescas,
com cara de banho tomado,
até o ar cheira a lavado.
São atrevidas, as manhãs de abril!
Sorriem a todos.
E tanto se entregam ao sol,
como acompanham as nuvens cinzentas
que garantam banhos mil.
Que ninguém leve a mal,
são assim as manhãs de abril.



13/04/15

Bendito ósculo!



Decididamente, hoje em dia, há "dia" para comemorar, promover ou simplesmente assinalar tudo de que o homem, bicho muito criativo, vai se lembrando. E mesmo o que, por algum esquecimento, ainda não é comemorado oficialmente, mais dia, menos dia, há-de ocorrer a alguém marcar no calendário.

Hoje, sou surpreendida com o “Dia do Beijo”.

Pergunto-me: quem lembrar-se-ia de criar este dia?
Seria, de facto, alguém que a se dar conta do quão essencial é o beijo, resolvesse tomar as rédeas da situação escabrosa que é ter um mundo "desbeijado" e decidisse, a bem da justiça, usar um dia para promover o ósculo e proporcionar ao povo carente, o pretexto perfeito para fazer uso dos lábios que Deus deu, que, por sua própria anatomia, não teriam, decerto, finalidade mais premente que o beijar...

Seja por que razão, esta é daquelas coisas que, decididamente, não podem ser "lembradas" apenas nas datas comemorativas: há que usar e abusar!

E nem precisamos de estudos a nos dizer que o beijo dá mais saúde, contraria o stress e faz bem à pele e a isto e àquilo também, se todos os que já beijamos, sabemos bem que o beijo é bom, é gostoso, desperta os sentidos e é de graça, meu povo!
Por isso: beijem e deixem beijar.

Melhor remédio: beijo.
Beijo de namorado; de marido; de esposa; de filho; de amigo; de mãe; de tia...
Todo beijo, cada um dum jeito, quando sincero, é bom demais.
E o melhor beijo é aquele a que não falta o abraço. Porque beijo sem abraço, é como queijo sem marmelada: é bom, mas não é completo...


11/04/15

Há...


Há um sonho por sonhar
Em cada olhar.
Há um amor
Que ficou para trás,
Há um desejo
Que se quis demais
E não se realizou,
Há um caminho
Que não se experimentou.
Há um carinho
Que não se estendeu,
Há uma tentativa
Que não se arriscou,
Há uma vida
Que não se viveu.

06/04/15

Bem disse que te-vi



Na casa em que cresci, no Rio de Janeiro, havia quintal e havia jardim, havia borboletas e havia passarinhos.

Não sei como é agora, passados todos estes anos, mas eu sou do tempo – já pareço aquela senhora do anúncio publicitário do hipermercado – em que havia muitas borboletas de todas as cores:
amarelas; azuis; com pintas e sem pintas; com riscas; outras pretas aveludadas e ainda umas outras com duas bolotas enormes nas pontas traseiras das asas, a imitar dois olhos vigilantes...
Para além disso, avistávamos de vez em quando, talvez levada pela aventura de descer da floresta, uma daquelas borboletas gigantes, com aquele seu bater de asas que parecia uma dança em câmara lenta  –  lembrança linda e irrepetível, dessas que guardamos no baú de nossas memórias.

No rol dos passarinhos, tínhamos o beija-flor que tinha um qualquer poder mágico que me hipnotizava.
E tínhamos, ainda, o bem-te-vi que passava a vida a alardear que nos havia visto - “bem-te-vi” – e era o preferido de minha mãe, que contava que na terra dela havia um outro passarinho, primo daquele, que, como era português, cantava “vi-te, vi-te” e, apressado que era, cantava mais depressa que o brasileiro. Claro está, que sempre achei que era história da carochinha.

Mas não é que o vi-te, vi-te existe mesmo! E é ele que tem cantado pra mim, em vez do bem-te-vi da minha infância.
Ao contrário do pássaro que ia ao quintal de minha casa e que eu avistava lá no cimo do coqueiro, o daqui é mais arredio – hoje pela primeira vez, ao fim de todos estes anos, consegui avistá-lo num galho alto duma árvore, a me espreitar e a me avisar: “vi-te, vi-te”.


Eu também o vi.



Interessante foi descobrir que o vi-te, vi-te também existe no Brasil, inclusive no Rio de Janeiro  –  mas esse, nunca foi ao meu quintal...
Quem quiser conferir semelhanças, pode espreitar os links:

* O bem-te-vi pode ser ouvido aqui.

* O vi-te, vi-te pode ser ouvido aqui.

P.S.
Descobri ainda, que Cecília Meireles também se encantou um dia, com o nosso bem-te-vi, de que falou  na sua História de bem-te-vi   eu, apesar de apaixonada por Cecília Meireles, não posso concordar quando sugere que o bem-te-vi deveria estar numa gaiola, mesmo que fosse elegante.
Ele só pode ser feliz, quando no cimo duma árvore bem alta, a nos surpreender com seu canto atrevido.