Não sei se já disse, mas se disse, torno a dizer: não sou portuguesa das cá nascidas, sou das que cá vieram parar.
Sou brasileira, não de estatura mediana; e tão pouco sou de gema, pois que essa era lusa, já que pai e mãe eram, por sua vez, de gema portuguesa. Porém, no meu Brasil fui feita e lá nasci. Depois, lá cresci e me fiz gente. Mas a vida, essa tonta que se julga dona de vontades e troca as voltas a toda a gente, como não poderia deixar de ser, trocou as minhas também.
E cá estou eu.
Cidadã portuguesa eu sou.
Confesso que não foi processo fácil. Não me refiro à burocracia da nacionalização que também foi dos processos mais complicados que se imagine! mas refiro-me sim, ao processo de adaptação de minha pessoa a este mar... que como amante apaixonado se queria estender a meus pés.
Eu, cega pelo amor ao outro que deixara algures a milhas de distância, nem me apercebia da grandeza que tinha tão próximo.
Eu se não podia ter o mar que queria, recusava-me a experimentar o que tinha perto.
E passaram anos.
Anos de estupidez alimentada pela saudade.
Não se poderá criticar. Os sentimentos de amor e desamor são daquelas coisas em que não adianta dar palpite: sente-se e pronto. Precisam ser mastigados, muito bem mastigados. E bem digeridos. Até que, com a ajuda do tempo, esse precioso aliado nosso, acabam então, por ser absorvidos e tal e qual como na digestão, os elementos bons são assimilados e os que não interessam são eliminados, excretados, postos fora.
E aí, ficamos mais leves e prontos para acolher novos sabores e novos amores.
Assim foi com este mar.
Não me recordo qual foi o momento, mas é facto que houve um primeiro momento.
Não se poderá afirmar que terá sido amor à primeira vista, embora fosse mais romântico se assim fosse, mas tornou-se, com certeza, num amor de maior importância, visto que foi um amor cultivado ao longo dos anos por este mar que nunca desistiu de mim. Nunca foi embora de vez. Sempre se deixou estar pelas proximidades, chegando mais próximo, de quando em vez. A mostrar-se, a dar-se a cheirar, para que não me esquecesse de sua presença.
E quando dei-me conta, estava eu perdida de amor.
Este mar é para mim, de suma importância. Poderei mesmo afirmar, sem medo de errar, de que é-me vital.
Adoro enfiar meus pés nas águas deste mar. Mesmo gelado que seja! Pois que é meu. E como o sinto meu: eu sou sua. Sou deste mar gelado, por vezes irado, mas é meu mar-amado.
Março/2012